sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Conto achado no banco de um ônibus

Ele sabia que não pediriam seu telefone nem tampouco lhe diriam algo romântico. Não tinha atrativos físicos, econômicos ou um andar elegante. Talvez um olhar mais forte, um pouco de gentileza, mas era como se todos pudessem ver sua meia furada através dos sapatos cansados.

Os encontros foram poucos, oito ou nove, não mais que isso. O suficiente para ele achá-la interessante. Seu rosto leve, às vezes realçado pelo óculos, pouca maquiagem, cabelo preso, vestida para um dia de trabalho. Discreta, sempre. Carregava uma mochila pesada. Ah! Esta foi a desculpa para abordá-la. Na primeira vez por pura cortesia. Estava sentado no fundo do ônibus, perto da porta para poder sair mais rápido. Foi ali que ele a notou.

Nas outras vezes virou um jogo. Se ele sentava no fundo, ela parava no meio do ônibus, no outro dia ele sentava por ali, ela ia para os fundos. A timidez o impedia de chamá-la: - Ei!

Os horários também não batiam, já a havia encontrado no ônibus das seis da manhã, outras vezes no próximo. Os cinco dias da semana viraram loteria. Um jogador não repete muito os números do último sorteio, como se eles não pudessem voltar a sair, assim se ele não a encontrava num horário, logo no dia seguinte tomaria o próximo ônibus.

Não dá para dizer que eram encontros ao acaso, coincidências. Pois ele a buscava. Montava estratégias, escolhia lugares, formas de dizer, de ser notado, frios na barriga, nascia a expectativa... que agora crescida não queria mais ir embora.

Por acaso, vamos deixar assim, ela sentou-se ao lado dele. Só porque alguém se levantou. Ele já carregava a mochila dela.

- Foi fácil hoje, não?! ele disse.
- Pois é... reticenciou ela.

E a primeira conversa veio. Trabalhos com assuntos fiscais, faculdade de direito, mudança de casa nos últimos meses. Por último, ele pede o nome dela. Ela retribui... Já ia me esquecendo de dizer que ela um dia lhe deu um "oi", num desses dias que as estratégias havia falhado. Dizendo assim, agora, parece algo sem sentido. Não foi isso o que ele disse, para ele foi motivo de ir sorrindo para o trabalho. 

Com as férias chegando isso significaria um tempo de desencontros, daí ele pediu um contato dela.

Depois da página 29 os nomes começaram a mudar, as pessoas a se repetir. Ele disse que procurou o contato que ela lhe ofereceu, mas o contato que deu, suspeitava ele agora, não era para ser encontrado. Ficava ainda a dúvida de que não havia procurado corretamente, não havia olhado todas as fotos, os lugares que muitas vezes dizia, "nas nuvens", "Pindamonhangaba", "Brasil"... Um fantasma.

Foi nesta hora que ele disse que ouviu algo cair. Procurou pelo chão, nada encontrou.
 
Não bastou os olhares, as conversas, o lugar do ônibus estrategicamente escolhido só para que ele pudesse lhe oferecer ou carregar seus pertences... Não bastou a mudança nos horários, a expectativa criada, o frio na barriga... Na melhor das hipóteses, ficou com um sorriso dela.

...

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Retrospectiva (ou uma mensagem de Boas Festas)



Foi um ano difícil, com certeza! Mas, e os outros anos também não foram?! Isso não faz com que este ano seja igual aos anos anteriores. Longe disso!!!
É que quando chega esta época do ano, as mensagens estampadas nas lojas, internet, outdoors, nas frases das pessoas, de Boas Festas soam um tanto estranhas, ou simplesmente, ditas, pois é isso o que se espera que seja dito. 


Partindo do mais óbvio “Festas” seriam celebrações, comemorações e assim, motivo para algo alegre. Ainda mais quando se trata do Natal e Ano Novo. Nos reunimos com as pessoas que são importantes para nós, preparamos algo diferente para a data, um prato de comida, uma roupa nova, ou até um sentimento novo... Como serem “Boas” se muitos daqueles que gostaríamos de compartilhar deste momento não vão poder estar na festa. Vai faltar um abraço, um prato na mesa, um olhar disperso.
E todas as decisões difíceis que tivemos de tomar neste ano, os laços mal feitos, as desconversas, os poucos encontros, a impaciência, os minutos perdidos, os motivos que desejamos nunca ter tido... Ao chegar numa festa, tornam-se “bons”, simples assim?!
2 taças (ou copos, não importa) de champagne e tudo passa. Esse seria o efeito do Espírito do Natal, ou seria só o efeito entorpecente do álcool?!
É triste ver que em plena era da comunicação, passa-se mais tempo falando sobre o amor do que, de fato, amando. Ouvir que a população está aumentando e estamos mais sozinhos do que a dez anos atrás. Com medo de sair nas ruas, e ao sair sempre com horas marcadas, desde ônibus lotados, consultas, ou toques de recolher. Desconfiados do poder e revoltados com os poderosos. Andar sem ouvir os próprios passos, esbarrar sem ser notado, acordar porque a rotina chama.
Nesta semana, uma mãe queixava-se por não saber o que vai fazer com o filho, pois no dia seguinte não haverá aula e terá que trabalhar. Olhando para a criança ao lado, cabisbaixa, foi difícil não pensar o inverso: “Vou aproveitar, faltar no trabalho, passar mais tempo com meu filho, almoçarmos juntos, assistir a um filme, e se alguém me chamar de irresponsável, que fique assim...”
Dizem por aí que nesta época do ano é tempo de renovar os votos, as esperanças... Sendo assim, BOAS FESTAS!

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Configurações de privacidade no Facebook

Fiz um pequeno tutorial sobre como modificar algumas configurações de privacidade no Facebook. Válido para quem está preocupado com marcações em fotos, por exemplo, além de se proteger contra publicações inconvenientes em tempos modernos. Segue:

  • Clique na seta ao lado de "Página inicial" no canto superior direito da tela;
 
  • Depois vá em "Configurações de privacidade";

  •  Em "Linha do tempo e marcação" clique em "Editar configurações";
 
  • Agora é só configurar à sua maneira. No meu caso deixei ativado duas opções;

  • "Analisar publicações em que você foi marcado antes de serem exibidas na sua linha do tempo";
 
  • e "Analise as marcações adicionadas pelas pessoas às suas publicações no Facebook";
 
  • Abs!

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Vítimas do modelo




A diretora de uma escola infantil da Vila Mariana, foi flagrada agredindo os alunos que tinham, no máximo, 4 anos de idade. Pasmos com a notícia?! Peraê... O “flagra” não foi um mero acaso. Houve uma denúncia, um movimento de instalação do equipamento de gravação e as imagens captadas só vieram a revelar algo que muitos já sabiam, outros desconfiavam, e outros, nem imaginavam.


Há tanta coisa para se falar sobre este assunto que dá medo começar estas linhas.


Em muitas escolas brasileiras já estão em funcionamento várias câmeras nas salas de aula e, também em algumas, nos banheiros. Após o incidente na Vila Mariana, essa escolha se faz certeira, afinal foi uma câmera quem gravou as imagens. A intenção é a mesma: manter a ordem nas escolas. Poucos pais são contra esta medida.
 
Para Esther Carvalho, diretora do Colégio Rio Branco, o monitoramento faz parte de um olhar mais amplo, afinal, “todo lugar que nós vamos temos esse tipo de recurso. A questão é se eu tenho uma atitude adequada, ele não me fere, não agride”, afirma. É o velho ditado “quem não deve, não teme.” O Colégio Rio Branco foi, recentemente, alvo de protesto dos alunos contra as câmeras nas salas de aula. 107 estudantes foram punidos. O que a escola finge não ver é que - seguindo a linha dos ditados - “o feitiço pode virar contra o feiticeiro.” Se a escola opta pela vigilância das câmeras não seria porque seu modelo educacional falhou?
Na reportagem, exibida pelo SPTV, no dia 08 de dezembro, o pai de uma criança desabafa que o filho passa mais tempo na escola do que com a família. Tamanha euforia pela vigilância só reforça algo que já sabemos, a falta de controle. Tanto dos pais quanto da própria escola, que, vítima do modelo que adotou, não é capaz de sanar as questões educacionais. Só resta, portanto, vigiar e punir.
Sentiram falta de algo? Não? Vamos ajudar: e a Educação, onde fica? Como é vista? Em qual proposta pedagógica as câmeras de vigilância se enquadram? Para a diretora psicopedagógica da Anima, Renata G. Brandoli, que trabalha numa linha construtivista, poucas famílias e/ou cuidadores investem em uma escola que apresenta uma proposta diferenciada. Preferem o modelo tradicional que, muitas vezes, opta pelo castigo. Algo muito similar ao que acontece nos lares. Com pouco tempo para discutir com os filhos, a punição é a melhor alternativa, afinal, tempo é dinheiro! Logo...
O que fica é a responsabilidade pela estadia da criança/jovem e de seu desempenho. Em outras palavras, a Educação nestes modelos, não passa do disciplinamento dos corpos. E para isso, basta o exemplo dado pela diretora da escola na Vila Mariana. Uma vez preocupados com a ordem (cabelo penteado, roupas limpas, estômago cheio, boas notas...), o olhar para o conteúdo que a criança traz é irrelevante. “Uma imagem vale mais do que mil palavras.”


A escola já optou por seu modelo desde o século XIX, com a adoção do panoptismo. A vigilância já havia sido instalada antes das câmeras. A construção da cidadania, premissa educacional, é feita a partir de possíveis erros, através da troca educador X educando. O medo de errar, vigiado constantemente, só vem a retardar este processo.
 
O tapa no rosto, físico, foi sentido apenas pela criança que não quis comer, porém, aqueles que ousaram sair do papel de vítimas dos supostos modelos que eles mesmos escolheram, não puderam de deixar de sentir, desta vez, o tapa na cara.


segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Aguardando http://www.aids.gov.br/...

Somos sujeitos vivendo a era da modernidade, certo? Após desembolsar aproximadamente mil reais num modesto computador e pagar todo mês menos de 50 reais para ter acesso ilimitado à internet, logo, no dia 1º de dezembro, Dia Mundial da Luta Contra a Aids, quis conferir algumas informações além dos vídeos produzidos para esta data. Não foi possível acessar à página www.aids.gov.br, aparecia apenas a mensagem “Aguardando http://www.aids.gov.br/...”

Sorte que a internet oferece inúmeras outras possibilidades para se atingir um objetivo. Contudo, a falta de acesso à pagina .gov seria uma forma de protesto? Ou estaríamos assumindo uma atitude visionária confusa, procurando teorias da conspiração, apenas? Vamos pensar.

Um dia antes, houve uma manifestação em frente ao prédio da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, na Av. Dr. Arnaldo, justamente para exigir respostas do governo frente ao descaso com as questões do HIV/Aids: fechamento de leitos, falta de profissionais de saúde, e inclusive, uma postura conservadora com relação à prevenção. 

Não só no modo virtual as instâncias governamentais deixam a desejar - e o que é pior - isso se dá de uma forma real. Nas telas do computador, a ferramenta “Google” vem a suprir as necessidades para buscar outros resultados que satisfaçam o acesso à informação. Mas, como ficam nos casos, nada virtuais, onde os portadores do vírus HIV sofrem com a falta de recursos, com o preconceito e a discriminação? Qual é a opção “Google” nestes casos? 

O Google é uma invenção, da mesma forma, é preciso inventar outras maneiras para que se possa atingir a um objetivo, seja ele, um estado de saúde, ou uma posição/atitude consciente. A invenção aqui vai servir apenas para se viver um pouco mais dignamente.

Agora, se me dão licença, cansei de ficar aguardando...

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Criança de 9 anos é encontrada acorrentada à cama no norte do PR



A cidade: Santo Antonio da Platina, cidadezinha no Paraná com menos de 50 mil habitantes. O caso: um casal acorrenta o filho ao pé da cama sem acesso à comida, água e banheiro.
Parece notícia policial, mas é. Após denúncias de vizinhos, a polícia encontrou o garoto preso na casa onde mora na tarde do dia 23 de agosto. O padrasto e a mãe foram trabalhar e acorrentaram o menor. Segundo eles, esta seria a primeira vez que fizeram algo assim e o menino estaria envolvido com drogas.

Em uma entrevista com o padrasto do garoto ouvimos o repórter: "Você sabe que agora, por mais que você tenha tido uma boa intenção, vocês vão responder judicialmente pela atitude que vocês tiveram?". O padrasto: "Com certeza. Só que acontece que eu não vou criar um moleque ladrão, maconheiro e bandido dentro da minha casa, para amanhã ou depois, vocês jogarem na minha cara que eu não fui pai e não pude educar". Depois ouvimos o padrasto relatar uma série de roubos cometidos pelo menino e, é de novo indagado pelo repórter: “Com tanta coisa errada (...) não era o caso de procurarem a Polícia Militar e falar ‘tá assim, não estamos conseguindo...’”. O padrasto: “Eu já liguei aqui (PM). Eu não, a minha esposa já ligou, acho que umas três ou quatro vezes. Mas ele sai de casa, ele some”.

Numa outra reportagem, a mãe dizia , "se tentar segurar é pau, pedra, tijolo, faca, o que tiver na frente ele taca. Não tem quem segure". O garoto ainda acrescenta detalhes, como a vez em que cortou o braço da irmã. A mãe também relata que “às vezes, é melhor acorrentar ali, do que ver mais tarde ele virar um bandido, um ladrão, um drogado. E você olhar na minha cara e falar que eu não criei meu filho, que eu não prestei para ser mãe”.

Crueldade dos pais? Um detalhe: o menino não apresentava sinais de maus tratos e já vinha sendo acompanhado pelo conselho tutelar desde 2008.

Por estes dias um programa de televisão que trata da rotina da polícia exibiu a ocorrência onde um menino estava em cima de uma casa jogando tijolos nas pessoas que passavam na rua. A polícia levou o menino para casa, que morava com a mãe e a avó e a questionaram. Esta mesma avó exibindo um atestado médico dizendo que o menino é hiperativo, disse que não sabia mais o que fazer com o menino, a mãe sai para trabalhar e o garoto foge da escola, de casa e fica “aprontando” pela rua. O policial respondeu: “a senhora é a responsável por ele!”

Não à toa os pais do garoto receiam sobre a opinião dos outros.

Se o menino se tornasse um bandido, um ladrão, um drogado, diriam que foi por falta de amor e cuidados. Não cuidou bem, agora não tem respeito. O oposto disto também traria dizeres: mimaram demais a criança. Por tanta permissividade, agora não tem o respeito do filho. De um lado ou de outro seriam acusados.

Mas, então, o que fazer?

E, assim (citando Calligaris), passamos do sentimento de indignação pela violência dos pais para a desconcertante e humilde perplexidade diante da impossível tarefa de educar...

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

15 de outubro: Dia Mundial de Lavar as Mãos



Hoje também é o Dia do Professor. Para o leitor mais ligado, já percebeu onde quero chegar.
Você seria capaz de enumerar quantos bons professores teve em sua vida? Mais ainda, qual foi o papel destes professores? Com certeza, um deles foi (co)responsável pelo caminho que você tomou em algum momento. Quando olhamos pela janela, percebemos que estamos vivendo outra realidade.
Hoje é dia do professor, mas nas escolas ouve-se que são educadores. Numa crítica dizia que “ser professor é apenas uma função técnica, ser educador vai além.” É relevante dizer que, de acordo com uma pesquisa, 20% dos professores da rede básica de ensino do Estado de São Paulo sofrem de depressão e 82% apontam ter sofrido algum tipo de violência física; uma outra pesquisa dizia que, as duas principais finalidades para os professores seriam 1) formar cidadãos conscientes (72,2%) e 2) desenvolver a criatividade e o espírito crítico (60,5%). O que está acontecendo!? Para se formar pessoas conscientes, críticas e criativas paga-se o preço com um atestado médico, um pneu furado ou um chute sorrateiro?
Há muito tempo atrás falava uma professora no Rio Grande do Norte, onde dizia, “parem de associar qualidade de educação com professor dentro de sala de aula.” Esta métrica ainda funciona, conforme apontou o Globo Repórter, exibido na última sexta-feira. Enquanto isso, nos grandes centros urbanos as escolas vão de mal a pior...
Conheço uma criança que vem fazendo uma campanha - solitária, claro - para conseguir amigos. Tem perguntado aos demais quem gostaria de ser seu amigo, abraça os candidatos, pede para tirar fotos dele com aqueles que se dispõem a ocupar esse lugar... Idiossincrasias à parte, esta criança passa grande parte de seu tempo na escola, como deve estar sendo sua campanha lá? Quem o (ou)viu, ou o apoiou? Algum professor? Educador? Algum amigo?
Onde estão agora as pessoas que um dia fizeram a diferença em nossas vidas? Já temos teorias demais para explicar o colapso escolar. Na prática, vemos Isadoras escrevendo seus descontentamentos em diários que agora são virtuais, e por isso saem de debaixo dos colchões. Uma mesma pesquisa apontava para o fato de que a maioria dos professores, apesar das dificuldades que enfrenta no cotidiano profissional, pretende permanecer na função que atualmente desempenha. Já não se sabe se isto é bom ou ruim.

Hoje, no Dia Mundial de Lavar as Mãos, deveríamos comemorar lavando as mãos! Ato higienista com bons resultados para a saúde física. Hoje, no Dia do Professor deveríamos parar de lavar as mãos. Ato usado por um certo procurador romano num caso importante. Sentido figurado para fugir da responsabilidade.

Hoje é dia do professor e/ou educador. Assim, o atual cenário da Educação é uma questão de nomenclatura. Posicionamento filosófico, político, de infraestrutura, piso salarial, investimento cultural, material didático, público, privado, questão de gênero, étnico, coletivo, individual...