quinta-feira, 29 de setembro de 2011

É um chapéu!

Certa vez, me perguntaram sobre alguma sugestão para se avaliar pessoas que vão trabalhar com crianças. Não lembro o que respondi na época, talvez algo sobre o que fazer com o choro das crianças, ou alguma coisa teórica... Se eu tivesse que responder a essa pergunta hoje minha sugestão seria esta:

Descreva o que você vê na figura a seguir:


Para quem entendeu a questão ou respondeu corretamente pode parar a leitura aqui, caso não, ofereço um pouco de contexto:



"Certa vez, quando tinha seis anos, vi num livro sobre a Floresta Virgem, 'Histórias Vividas', uma imponente gravura. Representava ela uma jibóia que engolia uma fera. Eis a cópia do desenho.
Dizia o livro: 'As jibóias engolem, sem mastigar, a presa inteira. Em seguida, não podem mover-se e dormem os seis meses da digestão.'
Refleti muito então sobre as aventuras da selva, e fiz, com lápis de cor, o meu primeiro desenho. Meu desenho número 1 era assim:


Mostrei minha obra-prima às pessoas grandes e perguntei se o meu desenho lhes fazia medo.
Responderam-me: 'Por que é que um chapéu faria medo?'
Meu desenho não representava um chapéu. Representava uma jibóia digerindo um elefante. Desenhei então o interior da jibóia, a fim de que as pessoas grandes pudessem compreender. Elas têm sempre necessidade de explicações. Meu desenho número 2 era assim:



As pessoas grandes aconselharam-me deixar de lado os desenhos de jibóias abertas ou fechadas, e dedicar-me de preferência à geografia, à história, ao cálculo, à gramática. Foi assim que abandonei, aos seis anos, uma esplêndida carreira de pintor. Eu fora desencorajado pelo insucesso do meu desenho número 1 e do meu desenho número 2. As pessoas grandes não compreendem nada sozinhas, e é cansativo, para as crianças, estar toda hora explicando.
Tive pois de escolher uma outra profissão e aprendi a pilotar aviões. Voei, por assim dizer, por todo o mundo. E a geografia, é claro, me serviu muito. Sabia distinguir, num relance, a China e o Arizona. É muito útil, quando se está perdido na noite.
Tive assim, no correr da vida, muitos contatos com muita gente séria. Vivi muito no meio das pessoas grandes. Vi-as muito de perto. Isso não melhorou, de modo algum, a minha antiga opinião. 
Quando encontrava uma que me parecia um pouco lúcida, fazia com ela a experiência do meu desenho número 1, que sempre conservei comigo. Eu queria saber se ela era verdadeiramente compreensiva. Mas respondia sempre: 'É um chapéu'. Então eu não lhe falava nem de jibóias, nem de florestas virgens, nem de estrelas. Punha-me ao seu alcance. Falava-lhe de bridge, de golfe, de política, de gravatas. E a pessoa grande ficava encantada de conhecer um homem tão razoável."
(Antoine de Saint-Exupéry)

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