segunda-feira, 29 de agosto de 2011

"Meu filho, você não merece nada"

O texto escrito pela jornalista Eliane Brum, intitulado “Meu filho, você não merece nada”, é bem claro ao falar das atuais crianças e adolescentes. A autora cita os jovens como uma geração ao mesmo tempo preparada com relação às habilidades, para lidar com as tecnologias, entretanto despreparada, pois não sabe o que fazer com as frustrações. Temos toda uma geração que foi ensinada a acreditar que a felicidade é um direito. Ao terem seus desejos satisfeitos pela presença de pais que querem garantir aos seus tudo aquilo que não tiveram, passa-se a ideia de que o esforço é algo a ser desprezado, ter de dar duro para conquistar o que se quer já traz consigo a marca do perdedor. Ora, ou não vemos um certo ideal de bacana ser aquele sujeito que se deu bem na vida?! Sem ter que estudar, claro. Estudar é para toda uma classe que nasceu desprovida e precisa ralar para ter um lugar de privilégios. 

Da mesma forma, existe a crença de que é possível viver sem sofrer. Todos os sofrimentos humanos podem ser classificados, diagnosticados em síndromes ou transtornos e, o melhor, podem ser tratados com uma pílula. Concordo com a reflexão da autora:

Quando o que não pode ser dito vira sintoma – já que ninguém está disposto a escutar, porque escutar significaria rever escolhas e reconhecer equívocos – o mais fácil é calar. E não por acaso se cala com medicamentos e cada vez mais cedo o desconforto de crianças que não se comportam segundo o manual. Assim, a família pode tocar o cotidiano sem que ninguém precise olhar de verdade para ninguém dentro de casa.”

Muitos relacionamentos familiares são construídos a partir desta premissa, resta fingir toda uma vida, uma vez que esteja baseada em uma ilusão. Em muitos casos, a casa cai. Quando pensamos no título do texto, “Meu filho, você não merece nada”, temos um erro (proposital?) da autora. Não merecer algo, pressupõe um futuro com uma recompensa, portanto, negada. Se fosse uma afirmativa, seria “você merece”. Se esta recompensa é o nada, ao negá-la teríamos algo, mas o que vem a ser?! Não merecer nada, significa que se merece algo, mas não podemos recair no erro de simplesmente inverter a frase, “Meu filho, você merece tudo”.  Seria potente demais merecer tudo, assim como seria angustiante demais merecer nada. Entre uma e outra pode-se pensar justamente naquilo que se nega nas frases citadas, a possibilidade de algo a ser construído, pois o que fica em jogo é apenas o merecimento, sem levar em conta todo o caminho até lá. E não foi desta forma que começamos este texto? Entre preparados e não-preparados, sofrer e não-sofrer, merecer e não-merecer, a dicotomia mascara algo. O quê?! Que cada um descubra suas próprias questões! Mas, desta vez sabendo que a vida é uma possibilidade em aberto.

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